quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

10. Phoenix Flight


Phoenix Flight

I.

O tempo passei tomando fôlego, tentando juntar
As minhas faces assim, num mosaico sem arte,
[Quebra-cabeça sem fim...]

Na falta de coisa melhor, deixei meus pés descalços,
Seria mais fácil culpar alguém pelo fracasso
Quem quiser que ande com os meus sapatos

Enfim, sem dimensão da distopia ninguém moveria um dedo,
Ninguém daria um passo rumo à utopia
[Educado pelo medo]

Se não puder fugir sem ter pra onde ir, recolho-me ao templo
Se não conseguir ver minha verdade interior
Peço mais tempo, pois, ainda não estou morto.

II.

Tenho que deitar numa cama em que eu não caibo
Tenho que sonhar numa noite em que eu não durmo
Tenho que renascer de um útero que eu rasgo
Tenho que partir sem deixar rastro, em silêncio
Tenho que cuspir nos pratos em que abuso
Tenho que ascender dos infernos que condeno

Devo ultrapassar os limites que me imponho
Devo alargar os horizontes que enxergo
Devo me reerguer e na curva do futuro
Devo reaprender e não levar a vida a sério
Devo muito mesmo, porém, não pago e não nego
Devo permanecer, já que sou a ferro e fogo

Nenhum psiquiatra, nenhum especialista
Nenhum biopoder nem o poder de polícia
Nem o mais condenável vício nem o domingo de missa
Nem o grito de guerra nem o silêncio de paz
Nem a palavra de ordem que com o vento se desfaz
Nada arrefece o ódio que vinca a escrita

III.

AURORA HORA AUREA
MUSIS AMICA EST
AURORA SURGENTE
MEMENTO MORI
MEMENTO SEMPER FINIS

[Aurora, hora dourada,
És amiga das musas
Aurora que vem surgindo
Lembre-se da morte
Lembre-se sempre do fim]

IV.

Não verso humores, senão chistes
Eu cantei amores, porém, amores tristes
O quanto cuidei das flores que existem
Tanto que deixo que todas as cores se desbotem
Os meses passaram, por que não?
Os anos por vir também não passarão?
Agora vejo que brota a semente
Atrasado, pois, o presente é exasperante

Aparentemente não há nada a diante
Nada é inconsciente, lugar nenhum é distante
Aparentemente, pois, nada será como antes
No rasgar da noite, prepara-se o levante

Não canto louvores, vejo vultos
Canto o que vem em sonho, ruído e luz de fundo
O quanto presto atenção ao que é oculto
Tanto que a todo instante estou à espera do salto
Não vem da garganta, nem do peito
De onde quer que seja, resiste a estética do medo
Removendo a terra, insepulto
No cemitério das ideias, último suspiro

Já veio a luz do sol ou ainda é alta madrugada?
Já sei onde estou, pra onde vou e o que me falta?
Se já é tempo agora, não me resta mais nada
Há em mim toda resposta, o caos não me exalta

Não curso horrores, outros sim
Na escuridão, não posso fugir de mim
O quanto sobressaltado levantei do colchão
Pra perceber: não posso viver sem paixão
Preciso de minhas asas pra voar
Preciso como qualquer de nós precisa do ar
Encontrar algum sentido em viver
Ou fazer acontecer, por fim, pagarei pra ver

Há tanto amor no mundo, viver pode ser simples
Convivemos, em resumo, num espaço com limites
De nada adiantou tanto ódio infecundo
Mas partir da compreensão do universo em expansão

V.

Os filósofos estão todos mortos
Cientistas estavam todos errados
Cozinharam tudo num banho morno
Ignorando o eterno retorno

Pelos quatro cantos do mundo
Por todos os mares e oceanos
Esconderam tudo em baixo dos panos
Já não posso mais viver no escuro

Busco quase à luz de velas
O rumo do meu caminho
Hoje sei que as retas paralelas
Se encontram no infinito

VI.

I was afraid of falling
Because where was I was too high
So I fell on the kitchen floor
Only then, only there I learnt to fly

On my struggle to be free
Someone sing along with me
I’ve been lost in the haze
Could not fit in this place

I kissed the ground, instead
I loved my fate, despite the fast decay
Death lay down beside me, I have felt it's ash
It was a delay

On my pilgrimage to nowhere
Still facing the same fears
Under a summer blue sky
I decided not to die

Sometimes I’ve woke up in the very middle of night
Sometimes I wouldn’t dare wake up from a nightmare
Sometimes I could not sleep until get one kiss from those lips
Sometimes I just could not care if my judgments were fair
Sometimes when I tried to steal one of those burning feathers
Rather than start to run, I went fly to the sun.

And I knew then
A new day is coming
Though I know now
A new dawn is rising
 
[Eu estava com medo de cair
Porque onde eu estava era muito alto
Então cai no chão da cozinha
Apenas então, apenas ali aprendi a voar

Na minha luta pra ser livre
Alguém cante junto comigo
Estive perdido na neblina
Não posso caber neste lugar 

Beijei o chão, ao invés Amei meu destino, apesar do rápido decair
A morte deitou ao meu lado, eu havia sentido suas cinzas
Foi uma demora

Na minha peregrinação para lugar nenhum
Ainda encaro os mesmos medos
Sob um céu azul de verão
Decidi não morrer

Às vezes acordei bem no meio da noite
Às vezes não me atrevi a acordar de um pesadelo
Às vezes não pude dormir antes de um beijo daqueles lábios
Às vezes não pude me importar se meus julgamentos eram justos
Às vezes quando tentei roubar uma daquelas penas em chamas
Em vez de começar a correr, fui voar para o sol

E soube então
Um novo dia vem vindo

Embora agora eu saiba
Se eleva uma nova aurora]

VII.

Poeta,
Tua meta, mesmo que breve seja tua jornada
E aja com destreza, ainda que tua morte esteja anunciada
E tua sentença transitada em julgado
A tua certeza, tua teleologia
Ainda que a vida seja tal qual uma rocha
E o mineral mais duro é o diamante
Mesmo que ornamente os pescoços da elite
Quem lhe arranca das entranhas da terra
É a tecnologia com a força do povo
Mesmo que demande greve de fome
E a explosão de um milhão de coquetéis molotov’s
Pra parir a fórceps um mundo novo
No teu peito, poeta, o ar que respira
Inspira a todos com as tuas rimas
Imprime nos outros o sentido da vida
Ode a todos os teus feitos, ser lido
Poeta, por teus riscos e rabiscos,
Lançados teus cantos aos sete ventos
Profusão de laringes, a Terra então vibra
Na calada da noite quando irrompe o dia
Na última vez que foste deitar
Nesta cama que não te deixas dormir
Liberta-te, pois, volte a sonhar!

VIII.

Voei alto sobre o abismo, talvez, o voo de Ícaro
Talvez o símbolo onírico, arquetípico - que pena!
Inércia tomara conta de meus pulmões e me afogara
Até que desacordara em meio às folhas em branco
Com a urgência da queda, o meu coração dispara
Trilho com minhas próprias pernas o caminho mais franco
Cantei as canções que quis, lancei-me, assim, aos céus
Nas alturas, fui feliz rasgando todo véu
Eu sonhara que morria e, quando acordava, não vivia
Hoje tem novo sentido tudo o que vivo a cada dia
Hoje há rima em cada verso como em tudo há poesia
Ao pretérito imperfeito, sou avesso, quem diria..?
Redefino minha loucura, reconheço meus defeitos
Pois, porto um vírus sem cura: a eterna procura

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